Como o sucesso ou o bom desempenho podem adiar o diagnóstico em anos?
- Debora Fernandes

- 12 de ago.
- 2 min de leitura
É isso mesmo! Infelizmente, quando pensamos nas avaliações desde a infância, os motivos que levam ao encaminhamento costumam ser algum tipo de problema de desempenho ou quebra de expectativa. Quer dizer, crianças que tiram notas baixas ou crianças que não se comportam conforme o esperado para a sua idade costumam ser encaminhadas para avaliação pela escola.
No entanto, quando as crianças têm bom desempenho acadêmico e seu comportamento, de forma geral, está de acordo com o esperado para o contexto escolar, elas não são encaminhadas.
Por um lado, podemos considerar que ainda não houve, na vida dessas crianças, uma demanda suficiente para que as dificuldades executivas apareçam. Essa consideração é válida e faz bastante sentido quando se pensa em crianças com alta inteligência. Elas vão dando conta das obrigações acadêmicas por meio de estratégias que desenvolvem e com certa facilidade, devido à alta inteligência. Nesses casos, a facilidade para aprender pode mascarar o TDAH.
Por outro lado, também podemos entender que, “a olho nu”, não estamos identificando características adequadas de TDAH para além do desempenho escolar e da expectativa do comportamento social da criança. Esses dois aspectos parecem ser marcos da “normalidade”, no sentido de que são os únicos levados em consideração para a decisão de encaminhamento. Se esses aspectos parecem adequados, então está tudo bem com a criança e não há motivo para avaliação.
Com certa frequência, eu escuto nas entrevistas das avaliações “eu não incomodava quando era criança”, “meus pais não tinham que se preocupar com as minhas notas” ou “eu não atrapalhava”. Essas frases representam bem o motivo dessas pessoas procurarem avaliação apenas na vida adulta. Não havia demanda aparente naquele momento de suas vidas e elas estavam agindo de acordo com o esperado em termos de escolaridade e comportamento.
Pois bem, imagem essa situação na vida adulta. A pessoa atingiu um bom cargo em uma empresa, fez uma formação acadêmica difícil, passou em concurso público. Como é possível ter TDAH com essas conquistas? Podemos traçar um paralelo interessante com o caso das crianças que têm bom desempenho escolar.
Novamente, se parece contraditório ter TDAH e ter sucesso acadêmico e profissional, estamos partindo de uma associação errônea entre TDAH e fracasso. Mesmo que o TDAH possa realmente prejudicar ou dificultar o desempenho das crianças e adultos, ele não necessariamente é um impedimento para que a pessoa consiga cumprir seus objetivos de vida. Um aspecto importante que as pessoas não observam é o sobre-esforço necessário, o esgotamento cognitivo e emocional, além das horas a mais que são desperdiçadas em comportamentos relacionados a distração e dificuldade com o engajamento inicial da atividade.
Tudo isso tem um custo emocional gigante para a pessoa, mas que na fala popular acaba se tornando algo como “ela se cobra demais” ou “ela é muito ansiosa”, quando na verdade, há um transtorno subjacente que justifica uma série de estratégias, compensações, regras autoimpostas entre outras possibilidades. Com o tempo, facilmente, essa pessoa pode começar a apresentar sintomas de ansiedade.
Assim, a difusão de informações mais assertivas por meio da formação inicial ou continuada poderia ser um caminho para que os profissionais envolvidos com o trabalho com crianças estejam mais atentos para sinais que vão além do desempenho acadêmico. Mesmo nesses casos, o diagnóstico na idade esperada também trará benefícios para a vida da pessoa e evitará muitos desgastes e dificuldades ao longo da vida.



Comentários